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Doutor em Direito Administrativo e presidente da Comissão Especial de Proteção de Dados da OAB-Federal, Flávio Henrique Unes Pereira foi um dos palestrantes do Fórum de Debates CNT “LGPD no Setor de Transporte – Novas Rotinas para Adequação à Lei”, realizado esta semana. Nesta entrevista, o especialista ressalta o papel da Autoridade Nacional de Proteção de Dados em estabelecer critérios e mediar conflitos. Ele fala também sobre a possibilidade de cada setor da economia homologar seus programas de compliance e, assim, se precaver de eventuais questionamentos. Confira:


Em 15 de outubro, o presidente Jair Bolsonaro nomeou os diretores da ANDP (Autoridade Nacional de Proteção de Dados). Constituída a diretoria, a agência está pronta para desempenhar sua missão? Qual é a importância da Autoridade?

O primeiro aspecto a ser ressaltado é a importância das nomeações. Sem elas, não se inicia a organização desse tão importante órgão regulador. E a importância da ANPD decorre mesmo de suas atribuições legais, que são muitas e estão elencadas no art. 55-J, da LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais). A regulamentação da LGPD, por exemplo, caberá a essa Autoridade, bem como a fiscalização do cumprimento da lei e a imposição de sanções administrativas. Isto é, a efetividade da norma dependerá das atividades da ANPD. Para além disso, caberá a ela receber as petições dos titulares de dados, os quais poderão reclamar o cumprimento das obrigações legais. 

Sendo a ANPD uma entidade criada pelo Estado e ligada à Casa Civil, há risco de se confundir segurança da informação com proteção de dados pessoais, como alguns analistas vêm alertando?

De fato, essa é uma preocupação plausível. O ideal, tal como previsto inicialmente no projeto de lei, seria que a ANPD fosse constituída como uma agência reguladora, ou seja, como uma autarquia especial. Quando se cria uma autarquia especial, garante-se maior autonomia administrativa e, especialmente, técnica na execução das competências legais. O Executivo, por meio da Administração Direta, não tem, nesse cenário, os mesmos poderes ou prerrogativas que existem quando se trata de um órgão dentro do Executivo. A LGPD, contudo, no art. 55-A, criou a ANPD como órgão dentro da estrutura da Presidência da República, dispondo, no parágrafo primeiro, que a natureza jurídica será transitória, podendo, dentro de determinado prazo, ser transformada em entidade da Administração Pública Indireta. Assim, é possível que essa questão volte a debate visando garantir maior autonomia técnica por parte da ANPD.

As sanções previstas pela LGPD vêm sendo consideradas muito pesadas. As multas previstas podem colocar as empresas em situação difícil?

De fato, as sanções são pesadas, podendo chegar a R$ 50.000.000,00 por infração. Daí a importância de a ANPD regulamentar o tema para estabelecer critérios mais detalhados, tendo em mira a proporcionalidade na aplicação de sanções, porquanto se trata de princípio de estatura constitucional.

Até que ponto a autorregulação é uma alternativa para setores em busca de adequação à lei?

O art. 50 da LGPD não previu apenas a autorregulação, porquanto dispôs, também, no seu parágrafo terceiro, que os regulamentos poderão ser reconhecidos pela ANPD. Isto é, haveria uma verdadeira co-regulação ou autorregulação regulada, na medida em que caberá ao órgão regulador validar a disciplina elaborada pelas empresas ou associações. Esse aspecto é de suma importância, pois conferirá segurança jurídica aos procedimentos criados pelas empresas e associações, uma vez que a regulamentação seria validada pelo órgão regulador, a afastar questionamentos posteriores quanto às regras que devem incidir sobre determinado setor. Essa autorregulação regulada poderá ser um farol para centenas de empresas de um mesmo segmento, de modo a dar maior eficiência na implementação de programas de compliance por parte de cada empresa, especialmente se o processo for liderado por associações de classe.

Que conselho o senhor dás às empresas neste momento, em que ainda restam dúvidas quanto ao alcance dos dispositivos da LGPD?

É preciso que as empresas tenham consciência dessa nova cultura acerca do tratamento de dados pessoais. De imediato, é preciso fazer um mapeamento do fluxo dos dados que são tratados. É preciso saber quais são esses dados, para que servem, qual a necessidade e a finalidade na colheita e no tratamento desses dados. A partir daí, será possível avaliar os riscos que tal fluxo de dados acarreta para a empresa, ao mesmo tempo que deverá ser elaborado um plano de conformidade. Feito isso, cabe revisão dos contratos, seja com fornecedores, seja com os próprios empregados ou parceiros da empresa. Neste momento, é hora de colher consentimento expresso do titular de dados para o tratamento de dados, bem como verificar quais seriam as obrigações de cada um nessa cadeia de suprimentos. O treinamento e o monitoramento do fluxo de dados são atividades constantes, especialmente porque a ANPD poderá requisitar relatório de impacto na proteção de dados. Essas são as ações básicas que devem ser adotadas pelas empresas neste primeiro momento.


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