Chris standing up holding his daughter Elva
Minas Gerais ganhou o Centro Internacional de Reciclagem Automotiva, o Cira,  inaugurado nesta sexta-feira (22/2), em Belo Horizonte, no Cefet (Centro Federal de Educação Tecnológica). Resultado de alguns anos de estudos e parcerias, o Cira vai reciclar automóveis em final de vida útil. A implementação custou US$ 1 milhão e foi financiada pelo governo japonês por meio da Jica (Agência de Cooperação Internacional do Japão). 

O coordenador do Centro e também professor do Cefet-MG, Daniel Enrique Castro, explica que o local produzirá conhecimento sobre o tema e buscará incentivar a implementação de outros estabelecimentos de reciclagem pelo país. A experiência japonesa mostra que pelo menos 95% do peso de cada veículo em final de vida útil pode ser reciclado. Daniel Castro é professor titular do curso de engenharia mecânica do Cefet-MG. Ele também é engenheiro aeronáutico com doutorado em engenharia de materiais pela Universidade de Karlsruhe, na Alemanha. Confira a entrevista:

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Por que criar um centro de reciclagem de veículos em Minas Gerais?
A ideia surgiu a partir de uma visita que fiz ao Japão, em 2010, junto a um grupo de representantes de vários países da América Latina, convidados pela Jica – a Agência de Cooperação Internacional do Japão. Eles enxergaram que a quantidade de veículos na América Latina cresceu consideravelmente e que não fazíamos muito pela reciclagem. No treinamento de lá, vimos como o processo japonês estava evoluído e comecei, então, a trabalhar para trazer a tecnologia para o Brasil. 

O que é o centro de reciclagem? Como vai funcionar?
É um projeto-piloto realizado dentro de uma escola, que segue o modelo tecnológico utilizado no Japão. Não tem finalidade comercial. Deve servir de base para treinamentos nessa tecnologia. Nossa finalidade é mostrar como se dá o processo de reciclagem de veículos. Temos, no Cefet, equipamentos de alta tecnologia. O governo do Japão fez um investimento US$ 1 milhão. Não temos outro centro assim por aqui. É o primeiro da América Latina.

Essa criação era uma necessidade urgente do país?
Precisamos implementar a cultura da reciclagem. O ser humano não recicla quase nada. Jogamos quase tudo fora de todos os produtos usados. No mundo, todo ano, são jogados fora 2 bilhões de toneladas de produtos. Não se recicla nem 9% de tudo o que é gasto.

Como será feita a reciclagem de veículos no Cefet-MG?
O veículo é um dos produtos mais difíceis de ser reciclado. A complexidade vem dos diferentes tipos de materiais, dos diferentes sistemas. Vamos tentar introduzir um processo de reciclagem específica do veículo para, depois, se reciclar o restante.

Quais serão as etapas?
Quando o veículo chega ao fim de sua vida útil, a primeira coisa é despoluir. Precisamos tirar fluidos, óleos, combustível. A segunda etapa é fazer a separação para se ter mais chances de reciclar os fluidos. Depois, chegamos aos elementos de segurança: baterias, airbags, cintos. A partir daí, é feito o desmonte de todos os sistemas. Tiramos motor, suspensão etc. Quando todos os elementos estiverem separados, vamos prensar a carroceria. Esse material vai para a indústria siderúrgica. As outras peças são inspecionadas e rotuladas para garantir a procedência e, depois, haver a destinação para o comércio. A maioria pode ser reaproveitada. Há pouco descarte.

Quanto é possível ser reaproveitado?
Pela experiência do Japão, menos de 5% do veículo, em peso, é descartado. Conseguimos reaproveitar 95%. Nesses 5%, geralmente, há restos de plástico e de vidro. O Japão é a nossa referência. Lá, eles estão trabalhando há 20 anos para conseguir esse grau de aproveitamento. Vamos trabalhar para chegar a reaproveitar até 100%. 

Também serão reciclados caminhões e ônibus?
Inicialmente, nossa planta processa automóveis, e não veículos pesados. Para isso, seria necessária uma maior dimensão. Mas esperamos conseguir cada vez mais empresas parceiras que possam trabalhar com a tecnologia com finalidade comercial.

É possível estimar o potencial de veículos que poderiam ser reciclados no Brasil?
É difícil saber ao certo. No Brasil, são registrados pelos Detrans todos os veículos novos. Mas, quando eles chegam ao final da vida útil, não ocorre a reciclagem. Sabemos que os países desenvolvidos reciclam de 4% a 6% da frota de veículos que circulam no país. Pensando nessa média, no Brasil, seriam cerca de 2 milhões de veículos por ano.

De onde vêm os veículos que serão reciclados no Cira?
Estamos recebendo veículos de montadoras. Alguns de testes, que são descartados. Também temos veículos de empresas que estão em fim de vida útil. Por enquanto, essa é a procedência. Mas podem vir a ser reciclados veículos apreendidos dos pátios dos Detrans, por exemplo.

É o primeiro centro de reciclagem de Minas Gerais? Há outro parecido no Brasil?
Esse é o primeiro centro de reciclagem de veículos, de alta tecnologia, na América Latina, destinado ao treinamento de mão de obra para essa nova área industrial. No Japão, esse setor envolve mais de 10 mil empresas. Elas atuam na reciclagem de diferentes materiais. Existe lucratividade. Precisamos despertar esse interesse nas empresas brasileiras.

A reciclagem de veículos é uma questão que vai além da ambiental e passa também por segurança?
Muito além. O que ocorre hoje no Brasil, em grande volume, é o comércio ilegal de peças de veículos. Temos o desafio de transformar a ilegalidade em legalidade, de organizar essa venda de peças. Talvez esse seja o apelo mais forte, o apelo da segurança pública. Sabemos que cerca de 500 mil veículos são furtados ou roubados por ano no Brasil. No geral, são retiradas as peças e vendidas ilegalmente. Se conseguirmos montar a cadeia de reciclagem, a venda de peças deverá ocorrer de forma segura. Nosso grande desafio imediato em relação a esse tema é transformar essa economia gigantesca e ilegal em algo legal. Para isso, estamos trabalhando junto ao Detran. O controle precisa ser maior. As leis precisam ser melhoradas. É um desafio de toda a sociedade. Precisamos introduzir um marco legal adequado para a reciclagem de veículos.

De que forma a Confederação pode auxiliar nesse processo?
A CNT pode ajudar a multiplicar a informação, a conscientizar a sociedade, a despertar o interesse dos empresários pelos centros de reciclagem. Estamos embarcando em um projeto audacioso de reciclagem de veículos com a venda das peças. Precisamos de apoio para estimular tudo isso. Quando eu estive no Japão, havia também um representante da CNT por lá. Esse contato com a Confederação foi muito importante.

Logo depois da viagem ao Japão, em 2010, e também em 2012, a CNT realizou em Brasília dois seminários internacionais sobre reciclagem de veículos e renovação de frota. O tema foi debatido por representantes de diferentes países. Na ocasião, o senhor lançou um livro sobre o tema?
Esse seminário internacional, com a participação de representantes do Japão, foi muito produtivo. Eu fiz o lançamento do livro “Reciclagem e Sustentabilidade na Indústria Automobilística. A CNT participou escrevendo um capítulo sobre transporte. Foi um passo importante. Logo depois, eu me dediquei a implementar a planta de reciclagem no Cefet-MG.

Quem vai atuar na planta?
Os alunos dos cursos de engenharia mecânica, engenharia ambiental, engenharia de materiais. Antes mesmo da inauguração, já reciclamos três veículos. Queremos agora multiplicar conhecimentos. Também devemos abrir para visitação tanto de escolas quanto de empresas interessadas.

Mais informações: https://www.cefetmg.br/ 

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